quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Era muitas vezes

ERA MUITAS VEZES


Era muitas vezes um homem que tinha filhos… e enteados. Os enteados eram mais do que os filhos; e os filhos eram mais do que os enteados, porque assim tinha que ser, que, se o não fosse, seria contra-natura.




Carlos Jesus Gil

27 comentários:

Nanda Assis disse...

meu marido é bem assim.

bjosss...

gabi mo disse...

nossa.
não tinha me dado conta de que sou enteada de alguém.

anónima funcionaria pub disse...

Ou eu muito me engano ou essa é a história de todo o Homem (escrevo com letra maíuscula porque incluo o género feminino e masculino).
Filhos são todos aqueles que amamos de coração (biológicos ou não), enteados os demais com quem nos temos de relacionar por circunstâncias diversas da vida.
Os enteados são sempre mais, em número, é evidente, porque é próprio dessa espécie humana ter de se relacionar com muito mais que os do seu coração.
Mas os filhos, aquele que retemos e cativamos, esses sempre serão mais, em qualidade, que os enteados, porque é desses que gostamos, é para esses que pende o coração.
O Homem é assim: gosta...ou não gosta, apenas suporta.
Porém, a nossa natureza por vezes leva-nos a atitudes contra-natura: a favorecer os enteados em detrimento do filho, e quando esse Homem consegue chegar a tal decisão(sofrida e que muito magoa) alcança o pleno da imparcialidade, da igualdade e sobretudo da Justiça, tornando-se verdadeiramente (oh advérbio redundante) HOMEM.
Como eu gostava de ver o meu país governado por Homens.

anónima funcionaria pub disse...

Não resisto a citar Antoine de Saint Exupery que, no seu Princepezinho, nos deixa uma lição de vida que infelizmente tantas vezes esquecemos (ou desconhecemos):

... Julgava-me muito rico por ter uma flor única no mundo e, afinal só tenho uma rosa vulgar...

Foi então que apareceu uma raposa .

- Olá, bom dia! disse a raposa.

- Olá, bom dia! - Respondeu delicadamente o princepezinho...

-Anda brincar comigo - pediu o princepezinho. Estou tão triste...

- Não posso ir brincar contigo - disse a raposa. - Ainda ninguém me cativou...

Andas á procura de galinhas? (diz a raposa)

Não... Ando á procura de amigos. O que é que "cativar" quer dizer?

... Quer dizer que se está ligado a alguém, que se criaram laços com alguém.

Laços?

Sim, laços - disse a raposa. - ...

Eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens necessidade de mim. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo e eu serei para ti, única no mundo...

(raposa) Tenho uma vida terrivelmente monótona...

Mas se tu me cativares, a minha vida fica cheia se Sol.

Estás a ver, ali adiante, aqueles campos de trigo? ... não me fazem lembrar de nada. É uma triste coisa! Mas os teus cabelos são da cor do ouro. Então quando eu estiver cativada por ti, vai ser maravilhoso! Como o trigo é dourado, há-de fazer-me lembrar de ti...

- Só conhecemos as coisas que cativamos - disse a raposa. - Os homens, agora já não tem tempo para conhecer nada. Compram as coisas feitas nos vendedores. Mas como não há vendedores de amigos, os homens já não tem amigos. Se queres um amigo, cativa-me!

E o que é preciso fazer? - Perguntou o princepezinho.

- É preciso ter muita paciência. Primeiro, sentas-te um bocadinho afastado de mim, assim em cima da relva. Eu olho para ti pelo canto do olho e tu não dizes nada . A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas todos os dias te podes sentar mais perto...

Se vieres sempre ás quatro horas, ás três já eu começo a ser feliz...

Foi assim que o princepesinho cativou a raposa. E quando chegou a hora da despedida:

- Ai! - exclamou a raposa - Ai que me vou pôr a chorar...

... Então não ganhaste nada com isso!

- Ai isso é que ganhei! - disse a raposa. - Por causa da cor do trigo...

Depois acrescentou:

- Anda vai ver outra vez as rosas. Vais perceber que a tua é única no mundo.

O princepesinho lá foi... - vocês não são nada disse-lhes ele. - Não há ninguém preso a vocês... - não se pode morrer por vocês...

... A minha rosa sozinha. vale mais do que vocês todas juntar, porque foi a ela que eu reguei, que eu abriguei... Porque foi a ela que eu ouvi queixar-se, gabar-se e até, ás vezes calar-se. Porque ela é a minha rosa.

E então voltou para ao pé da raposa e disse:

- Adeus...

- Adeus - disse a raposa. - vou-te contar o tal segredo. É muito simples:

Só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos...

Foi o tempo que tu perdes-te com a tua rosa que tornou a tua rosa tão importante.

- Os homens já se esqueceram desta verdade - disse a raposa. Mas tu não te deves esquecer dela.

Ficas responsável para todo o sempre por aquilo que está preso a ti. Tu és responsável pela tua rosa...

...E os enteados podem um dia vir também a ser teus filhos, às vezes é só querer.

Anónimo disse...

Pobre homem que difícil gestão tem de fazer!

PreDatado disse...

E tem filhos?

Unknown disse...

A anónima funcionária pública teve aqui um trabalhão levado da breca. É gil, tens que lhe pagar pá. Não estou bem de acordo com a interpretação que ela faz do post, mas é bem lógica também. É por isto que estes textos são bons: permitem-nos muitas divagações e todas lógicas.

Anónimo disse...

Vejo nete texto mais matéria política que outra qualquer. o Gil não costuma escrever directo, usa a alegoria sistematicamente. Os enteados são em maior número que os filhos mas estes são mais, têm mais regalias que aqueles. Como sempre foi assim, é que a ser doutro modo seria contra-natura.
Também gostei da lógica da anónima tal e tal.

Anónimo disse...

Vivemos numa sociedade em que infelizmente uns são filhos e outros enteados.
As pessoas até são capazes de compreender as dificuldades desta crise internacional. Depois de, nos anos 90, lhes terem dito para se endividarem, têm sido, até, muito compreensivas. O que já não aceitam é que, ante a crise, haja filhos e enteados. Porque há-de a factura sobrar para os de sempre, quando a corrupção campeia e os governos protegem os mirabolantes ganhos e lucros de uns poucos?
Acabou-se a pachorra para quem arquivou nas gavetas do esquecimento, os valores do social e da solidariedade.

Anónimo disse...

Mais um pequeno mas grande texto. É mesmo assim, senhor Darwin. O senhor tem toda a razão.

Anónimo disse...

Nós, os enteados, usemos o poder do voto para acabar com a injustiça social. Ou pelo menos diminuí-la.

dragao vila pouca disse...

Ó Gil, meu caro, descomplica que para complicar já basta a crise.

Um abraço

Alexandrina Areias disse...

Olá, boa noite!
Gostei imenso da interpretação deste texto, dada pelos anónimos "leitor" e "Darwin"... Acho que fizeram uma óptima interpretação... Sem dúvida que na nossa sociedade e principalmente, no mundo da política, há os filhos e os enteados...
Há os filhos que têm tudo de "mão-beijada", sem grande esforço para o conseguirem... e há os enteados, que já têm que lutar por aquilo que querem...
E como diz o "real gana", se assim não fosse, seria contra-natura...
Beijos,

AA

Unknown disse...

Vamos a isso, anónimo das 18:43.
Muito bem darwin, leitor e AA.

Ana Maria disse...

Aos filhos e enteados, tratamentos iguais.
Bjs!

mdsol disse...

O título do blog é o máximo...
Hoje passo a correr... é tarde!
Foi boa a visita lá ao branco no branco e boa a surpresa aqui. Apareça sempre!
Voltarei
:))

o que me vier à real gana disse...

Bom sono!

Excelentes comentários!

Isabel disse...

Ainda bem que isso é passado (será?).
Um bom dia para ti

Bjt

Mariazita disse...

Interessante jogo de palavras.
Esse homem não fugia à regra natural da vida (não era contra-natura).
Os enteados eram mais, ( em número) ; os filhos eram mais (em importância - mais valiosos).

Bj
Mariazita

Anne M. Moor disse...

Gil,
Passei aqui para lhe retribuir sua visita lá no meu blog e as carinhosas palavras. Volte sempre! Eu aqui também voltarei para divagar consigo e suas visitas :-)

Abraços

dragao vila pouca disse...

Ó Gil, quem assustou a Carla P.S., que ela nunca mais voltou?
Carlinha, minina, volta, nós tratamos-te bem, como filha e não como enteada.
Beijos e abraços

Daniel Costa disse...

O que me Vier à Real Gana

Nestes casos, é fatal acontecer! O pobre homem tem de ser o pai de toda a malta. "assim tem de ser."

Abraço,
Daniel

Anónimo disse...

"Era muitas vezes"...um 1º Ministro arrogante, mal educado, com falta de civismo e que ontem pouco faltou para saltar do seu lugar e agredir uma deputada em pleno debate quinzenal no plenário...isto após ter-lhe chamado de forma recôndida tudo e mais alguma coisa. Penso que esse "Era muitas vezes" poderia mudar para "Já são vezes a mais...".

Anónimo disse...

O Primeiro anda a abusar. como diz otalqueeraejánãoé.
Fixe o que diz o senhor dragão. A carlita aqui será tratada como filha e não como enteada.
Tenho a certeza que o gil vai dar um excelente à mariazita.

Anónimo disse...

o otalqueeraejánãoé se calhar era enteado e agora é filho.
Sou o mesmo anónimo de há pouco, mas só agora pensei nisto.

Anónimo disse...

Vamos votar em quem, amigo Anónimo?
Eu, que sempre defendi e defenderei a democracia, não sei como poderei votar nas próximas eleições, pois perdi a confiança nos dirigentes políticos.
E agora diga-me lá! Voto em quem?
Voto no CDU? Não, porque não gosto de cartilhas de pensamento único …No BE? Sou contra o populismo...No PP? Isso nem pensar... No PSD? Não, porque estão cada vez piores... a sua líder, é um belo exemplar dos políticos de pacotilha, que não tem qualquer ideia para o País, por isso não poderá ser alternativa a ninguém. Aliás a senhora está a tornar-se numa anedota do disparate político.

Diga-me então, em quem eu voto?
Mais vale uma desilusão na vida, que uma vida de ilusão!

Carlos Rebola disse...

Se era muitas vezes (não sempre) que tal facto ocorria, algumas vezes seria contra-natura a situação do tal homem, com filhos ... e ou enteados.
Concordo com a Mariazita.

Abraço
Carlos Rebola