UMA ALDEIA, UM MONTE,
UM VELHINHO, O FILHO, UMA MANTA E UM CANIVETE
Conta-se que naquela
aldeia, mandava a tradição, chegados a uma determinada idade os velhinhos eram
levados pelo filho fisicamente mais possante para o cume da montanha em cujo
sopé tinha sido edificada. Com eles levavam apenas uma manta, um alforge com
comida para alguns dias, bem como um garrafão com uns litros de água. Ninguém o
fazia por maldade, mas a verdade é que os velhinhos eram levados para ali
terminarem os seus dias… Era a tradição, qual Lei Superior, qual
Jurisprudência! Ninguém reclamava!
Tudo termina
quando, naquele Dia de Mudança, ao despedirem-se lá em cima, mesmo antes de o filho
retornar à base, triste, obviamente, o pai lhe pergunta: “filho, trazes contigo
um canivete?”, “Claro, senhor meu pai, trago sempre”, “Então, como a manta é
tão grande, corta-a ao meio. Assim ficas já com uma para quando o teu filho te
trouxer para cá. Escusas de comprar.”… O filho não tarda a perceber que há
tradições e tradições. Esta já não teria mais dias para contar! Pega no pai, não
se sabe se trouxe consigo o saco e a manta e a água, bem presente encontra-se o
facto de os dois terem voltado para casa juntos, e que foram ainda bastantes os
anos em que com estima conviveram e se trataram de filho e senhor meu pai.