PARÁBOLA
O LÁPIS E A BORRACHA
Moravam no mesmo estojo, um lápis todo janota e uma borracha toda borracho. Ambos executavam com brio as suas funções: se o lápis escrevia – não fosse, ou mesmo fosse, o que devia -, lá vinha a borracha, esbelta, esguia, e tudo, tudo de algo delia.
Duro coração, o daquela borracha. Como enganava aquela textura macia!; coitado do lápis, incansável e abnegado trabalhador, amigo de verdade, um indefectível! Esferográficas, marcadores, afiadeira, tubo de cola, caneta correctora, lápis de outras raças, até a própria borracha, todos podiam contar com ele. Aliás, todos os coabitantes daquele estojo eram família. Bem, não o foram sempre, mas tornaram-se. Uma verdadeira Pensão Familiar, aquele estojo.
De facto desconheciam-se por ali querelas, graves aborrecimentos. Talvez as esferográficas tivessem alguma razão de queixa da caneta correctora…, nada, contudo, de muito exasperante. O corrector nunca fora tão rude, é verdade que, volta-e-meia, toldava a lavra da esferográfica, mas a coisa era feita com alguma delicadeza e mesmo serenidade.
Com a borracha a atitude era outra, com ela era tudo à bruta!... De maneira que o bom do lápis andava desgostoso, mesmo deprimido com o desdém com que era tratado pela vizinha. E diminuído que estava! Bem, é certo que todos os lápis em função decrescem com a idade, mas com aquele era demais, tantas, em tão pouco tempo, foram as vezes que visitara o aguço. O mais terrível de tudo era a consciência do pouco que tinha produzido, pois tanto fora devastado.
Estava, pois, na hora de uma conversa de macho para fêmea (de ser para ser, que não era dessas coisas, o lápis); ser borracha é tanto como ser lápis, uma não é mais que outro!, pensam os justos.
- Por que me tratas assim, vizinha?
- Assim como, rapaz?
- Assim, tão friamente, despeitando-me com assaz constância, derrubando tanto do que ergo.
- Está na minha natureza, lápis, não é por mal, crê!
- Mas não podias, ao menos, não passar por cima de algumas coisas? Às vezes até voltam ao mesmo, coisas que apagas!
- Não, é instintivo, já te disse que é a minha natureza. Repara, tu também tens a tua natureza, a qual, por sua vez, também há-de, de quando em quando, ferir o prestável papel. Não com a pressão que exerces sobre ele, mas com a substância de algumas das marcas que lá deixas. E olha que há papel bastante nobre, que não merece certas coisas!...
- Pronto, já vi que não mudas. Olha como já estou tão pequenino!
- Lápis, sinceramente… não te julgava tão piegas! Eu também estou bem mais pequena, de cada vez que apago a tua lavra também eu perco físico. Mas quem te julgas tu afinal?, o desditoso mártir do estojo?!
Posto isto, ao bondoso do lápis não resta senão a resignação: uma vida implacavelmente a correr para o fim, ao ritmo frenético das inexoráveis apagadelas!... – Deixa lá, está na nossa natureza!
Carlos Jesus Gil
sábado, 8 de setembro de 2007
sexta-feira, 7 de setembro de 2007
Tu, quem és?
TU, QUEM ÉS?
Quem és tu, que volta-e-meia lembras que tudo em ti é teu? Não és, acredito, essa que eu vejo, apenas a tens!
… Mas, se a essência é o ser, e não o ter, porque sofres tanto por ele; porque te vendes tantas vezes; porque insinuas, não raro, mudança de figura?... se és sempre a mesma!... Será para mostrares quem és?
Carlos Jesus Gil
Quem és tu, que volta-e-meia lembras que tudo em ti é teu? Não és, acredito, essa que eu vejo, apenas a tens!
… Mas, se a essência é o ser, e não o ter, porque sofres tanto por ele; porque te vendes tantas vezes; porque insinuas, não raro, mudança de figura?... se és sempre a mesma!... Será para mostrares quem és?
Carlos Jesus Gil
Discriminação
DISCRIMINAÇÃO
Ó iníqua oxidação discriminatória!
Ó iníquos trilhos – para alguns – sinuosos,
demasiado sinuosos!
Serás, mulher feita com o relógio,
também assim na atitude?
Carlos Jesus Gil
Ó iníqua oxidação discriminatória!
Ó iníquos trilhos – para alguns – sinuosos,
demasiado sinuosos!
Serás, mulher feita com o relógio,
também assim na atitude?
Carlos Jesus Gil
quinta-feira, 6 de setembro de 2007
T' ás com quantos...?
T’ÁS COM QUANTOS…?
Dois amigos não se vêem há mais de dez anos; um Sporting/Benfica proporciona-lhes o inopinado reencontro:
- Não acredito, olha quem eu aqui venho encontrar! T’ás porreiro Manel?
- Oh, oh! Olha o Joaquim, como é que vai isso, pá? Há quanto tempo…!
- É pá vai bem, dá cá um abraço (iam partindo uma costela um ao outro). Mas e tu, pá, como vais?
- Na maior, Quim, felizmente as coisas correm bem.
- Então, vens ver o teu Benfica perder?, eh, eh,…
- Quinzito, Liedson resolve!..., às vezes.
- Mas, é pá, tu t’ás na mesma! Os anos não passam por ti.
- Tu também t’ás igual, pá.
- Oh, oh, t’ou pois, já cá cantam 52.
- 52?!...
- Pois, sou mais velho do que tu, não te esqueças.
- Eu sei, eu sei.
- Davas-me menos, era?
- É pá dava, dava-te menos…………… um quarto de hora!
Cada um para a sua claque; nunca mais se falaram.
Carlos Jesus Gil
Dois amigos não se vêem há mais de dez anos; um Sporting/Benfica proporciona-lhes o inopinado reencontro:
- Não acredito, olha quem eu aqui venho encontrar! T’ás porreiro Manel?
- Oh, oh! Olha o Joaquim, como é que vai isso, pá? Há quanto tempo…!
- É pá vai bem, dá cá um abraço (iam partindo uma costela um ao outro). Mas e tu, pá, como vais?
- Na maior, Quim, felizmente as coisas correm bem.
- Então, vens ver o teu Benfica perder?, eh, eh,…
- Quinzito, Liedson resolve!..., às vezes.
- Mas, é pá, tu t’ás na mesma! Os anos não passam por ti.
- Tu também t’ás igual, pá.
- Oh, oh, t’ou pois, já cá cantam 52.
- 52?!...
- Pois, sou mais velho do que tu, não te esqueças.
- Eu sei, eu sei.
- Davas-me menos, era?
- É pá dava, dava-te menos…………… um quarto de hora!
Cada um para a sua claque; nunca mais se falaram.
Carlos Jesus Gil
quarta-feira, 5 de setembro de 2007
Atmosferas
ATMOSFERAS
Não leves a mal
por, não raro, gerar vendaval…
É vento de momento,
passageiro como o tempo,
mal começa – em noite ou dia -,
já espreita a calmaria.
Carlos Jesus Gil
Não leves a mal
por, não raro, gerar vendaval…
É vento de momento,
passageiro como o tempo,
mal começa – em noite ou dia -,
já espreita a calmaria.
Carlos Jesus Gil
Caridade
CARIDADE
Mesmo uma sociedade plenamente justa (o pleno na Justiça é, penso, pura utopia) não prescinde da caridade.
Caridade é dar dinheiro, pão, roupa, sim, é tudo isso mas muito mais: é visitar quem necessita de visitas; é saciar de companhia quem dela carece; é fazer sorrir quem não vê razões para isso; é tantas outras coisas que, como estas, nunca existem em suficiência…, por mais justa que uma sociedade seja.
Carlos Jesus Gil
Mesmo uma sociedade plenamente justa (o pleno na Justiça é, penso, pura utopia) não prescinde da caridade.
Caridade é dar dinheiro, pão, roupa, sim, é tudo isso mas muito mais: é visitar quem necessita de visitas; é saciar de companhia quem dela carece; é fazer sorrir quem não vê razões para isso; é tantas outras coisas que, como estas, nunca existem em suficiência…, por mais justa que uma sociedade seja.
Carlos Jesus Gil
terça-feira, 4 de setembro de 2007
Economia à portuguesa
ECONOMIA À PORTUGUESA
Bem sei que, como tantas outras coisas, a Economia é cíclica, vivendo obrigatoriamente várias fases que ressuscitam. Aliás, são-lhe vitais os ciclos.
Porém a nossa… a nossa só admite dois estados (antagónicos, embora não muito), é maníaco-depressiva, é bipolar.
Carlos Jesus Gil
Bem sei que, como tantas outras coisas, a Economia é cíclica, vivendo obrigatoriamente várias fases que ressuscitam. Aliás, são-lhe vitais os ciclos.
Porém a nossa… a nossa só admite dois estados (antagónicos, embora não muito), é maníaco-depressiva, é bipolar.
Carlos Jesus Gil
segunda-feira, 3 de setembro de 2007
Passou-se há já algum tempo
CLIMA MEDITERRÂNICO COM MANIAS
Há uns anos escrevi assim:
O sol por vezes acorda tarde. Talvez em resultado de noites agitadas… Pior é quando nem dá acordo de si durante largos períodos – tal não é a bebedeira!...Os Invernos são propícios a hélio-bebedeiras, tantos são os dias em que se encontra de ressaca!
Hoje escrevo assim:
Publicitem a instituição, por mais oneroso que seja, publicitem-na!
São eficientes, os tipos; terapia milagrosa!... Transformaram um absentista militante num fanático trabalhador. É obra!...
Há poucos anos dizia-se (aliás, hoje ainda se exclama): “bom tempo, hum…solinho!” (sol sóbrio).
Mas eu digo: ontem, seis de Setembro de dois mil e cinco, houve bom tempo. O sol, ressacado, não apareceu e as gotas de água das nuvens, embora ainda com pequeno peso, caíram, timidamente, mas caíram. Promessa de melhores dias para a vida no seu todo.
Sol sóbrio = bom tempo? Sim, mas só se apanhar uma chiba de vez em quando!
Este nosso clima, temperado mas pouco…, caminha a passos largos para a esquizomania!
Culpados? Os ciclos naturais, com certeza, mas também a ausência de afectividade a que foi votado… o Planeta.
Carlos Jesus Gil
Há uns anos escrevi assim:
O sol por vezes acorda tarde. Talvez em resultado de noites agitadas… Pior é quando nem dá acordo de si durante largos períodos – tal não é a bebedeira!...Os Invernos são propícios a hélio-bebedeiras, tantos são os dias em que se encontra de ressaca!
Hoje escrevo assim:
Publicitem a instituição, por mais oneroso que seja, publicitem-na!
São eficientes, os tipos; terapia milagrosa!... Transformaram um absentista militante num fanático trabalhador. É obra!...
Há poucos anos dizia-se (aliás, hoje ainda se exclama): “bom tempo, hum…solinho!” (sol sóbrio).
Mas eu digo: ontem, seis de Setembro de dois mil e cinco, houve bom tempo. O sol, ressacado, não apareceu e as gotas de água das nuvens, embora ainda com pequeno peso, caíram, timidamente, mas caíram. Promessa de melhores dias para a vida no seu todo.
Sol sóbrio = bom tempo? Sim, mas só se apanhar uma chiba de vez em quando!
Este nosso clima, temperado mas pouco…, caminha a passos largos para a esquizomania!
Culpados? Os ciclos naturais, com certeza, mas também a ausência de afectividade a que foi votado… o Planeta.
Carlos Jesus Gil
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