quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

E o Alberto e o Albino também...

E O ALBERTO E O ALBINO TAMBÉM…


AS DÚVIDAS DO ALBERTO


- De maneira que aqui estou na maior das aflições.
- É pá, ouve lá! Não achas que estás a exagerar?
- A exagerar, eu? Antes estivesse., aliás, rezo para que a visão que tenho disto transborde de exagero e de preocupações infundadas. Mas não, caro amigo.
- Então mas só pelo facto de ela fazer noites com grande frequência?
- Por esse, por um outro que passa por um cansaço permanente – quando a abordagem se dá -, por outro ainda que se manifesta no seu não enraizado mau humor. Albino, têm-se passado muitas coisas estranhas. Ela não era assim, de todo!
- Acho que deves ter uma conversa sincera e hipocritamente calma com ela.
- Pois, tenho andado a adiar mas vai ter que ser… É pá, e se ela me diz que sim, que é efectivamente verdade, que anda a ser objecto de picada de enfermeiro? É do caraças! Não sei qual irá ser a minha reacção, e esta tem sido a razão deste protelamento em pôr tudo a limpo.
- Olha, queres contratar um detective?
- Tás tolo?! Eu dou-lhe o detective…
- Já estou a começar a não gostar dos teus indícios de comportamento. Vê lá se és racional. Compreendes a sociedade como poucos, conheces o mecanismo dos fenómenos – sim, não me olhes assim…, que destes também estás por dentro -, conhece-la bem a ela… Só tens que adoptar a abordagem certa e avançar.
- Pois, é fácil quando se está na bancada, não é? Eventualmente até conheço bem estes meandros; serei, até, não tenho grandes dúvidas, um excelente analista de casos quejandos, mas isso é quando o papel principal é desempenhado por outro actor. Já agora, qual, no teu entendimento, é a abordagem certa?
- Ó pá, Alberto, já aqui te falei dela. É, forçosamente, uma abordagem eivada de calma - ou calma fingida, também pode ser -, que não descure a fria lógica das coisas. Não tens que anular o factor emocional, não! O que não podes é deixá-lo, qual ditador, dominar hegemonicamente o teu discurso e a tua performance de gestão das coisas internas. Olha, vamos é beber mais um copo. Ó garçon, por favor mais duas coisas destas… com muito gelo, que o ambiente aqui aqueceu muito.
- Olá!... Isso é que é dar-lhe, hem?
- Então, tudo bem, narrador?
- Olá chefe!
- Tá tudo porreiro. Andava à procura do Alberto, e o Guedes, aquele da livraria Calhamaços e outros, disse-me que ele estava aqui contigo.
- Pois não te enganou!
- Passa-se alguma coisa, narrador?
- Passa sim, Alberto. É pá, a tua esposa ligou-me a pedir-me “um grande favor”. Anda preocupada contigo; diz que lhe falas sempre com duas pedras na mão e que não és o mesmo de há uns dias a esta parte. Resumindo: pensa que tens uma amante.
- Essa agora!... Estás a topar, Albino? Então eu agora é que ando para aí a dar umas escapadelas?!
- É pá, isso só prova que é tudo falta de comunicação.
- Mas…, do que estão vocês a falar?
- Narrador, o Albino anda muito triste, mesmo deprimido, porque julga que a mulher tem um amante lá no hospital. Chamou-me para beber um copo e saber a minha opinião acerca de.
- Então há aí confusão, e da grande, mas, a meu ver, não passa disso.
- Pois, é o que eu acabo de dizer. Muito trabalho, falha nas comunicações, a cem à hora p’ra todo o lado… Uma combinação que resulta sempre em complicação.
- Espero que vocês estejam certos!...
- Vais ver que é isso, ó Alberto.
- É, meu amigo. O grande recife não passa de um pequeno escolho originado pelas exasperantes circunstâncias com que temos que lidar diariamente. Cabe-nos adquirir as competências para lidar com as situações, saber distinguir uma Sagres de uma Super bock, a bem de um caminho menos sinuoso. Liga à tua mulher e vão jantar fora. É o meu conselho.
- … Faz isso, Alberto.
- Pede aí a conta.
- Vai-te embora que eu pago. Bebes alguma coisa, narrador?
- Bebo uma imperial.
- Ainda aí estás? Vai-te, Alberto!... Arre!
- … Pois estas coisas são …




Carlos Jesus Gil
06/12/2007

1 comentário:

Tomas de alencar disse...

Brilhante esta tua capacidade narrativa.